sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

... para mim.

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De quanto se escreve, só amo alguém que escreve com o seu sangue. Escreve com sangue , e descobrirás que o sangue é espírito.
Não é nada fácil compreender o sangue alheio; eu detesto todos os que lêm como ociosos.
Quando se conhece o leitor, já nada se faz pelo leitor. Mais um século de leitores, e o próprio espírito será um fedor.

Que toda a gente tenha o direito de aprender a ler, eis o que com a continuação vos aborrece não somente de escrever mas de pensar.
Outrora o espírito era Deus, depois fez-se homem, agora transforma-se na populaça.
O que escreve com o seu sangue e em máximas, não quer ser lido, mas decorado.
Nas montanhas, o caminho mais curto vai de cimo a cimo; mas para isso é preciso ter pernas altas. As máximas devem ser cumieiras, e aqueles a quem as destinas devem ser esbeltos e altos.
O ar leve e puro, o perigo próximo e o espírito pleno de alegre malícia, tudo isto se harmoniza maravilhosamente.
Gosto de me ver rodeado por duendes maliciosos, porque sou corajoso. A coragem afugenta os fantasmas, mas cria os seus próprios duendes. A coragem gosta de rir.
Sinto todas as coisas diferentemente de vós; a nuvem que distingo abaixo de mim, escura e carregada, e de que me rio - é para vós uma nuvem tempestuosa.
Vós olhais para cima, porque aspirais a elevar-vos. E eu, como estou no cimo, olho para baixo.
Qual de vós sabe ainda rir?, mesmo depois de ter atingido o cimo?
O que escala os mais elevados montes ri-se das cenas trágicas do palco como da gravidade trágica da vida.
Corajosos, despreocupados, zombeteiros, imperiosos, assim nos quer a sabedoria; é mulher e só pode amar guerreiros.
Vós me dizeis: "A vida é um fardo pesado." Mas para que vos servem o vosso orgulho matinal e a vossa resignação da tarde?
A vida é um fardo pesado? Não vos mostreis tão contristados! Não passamos todos de uns bons burrinhos e burrinhas de carga.
Que temos de comum com o botão de rosa que verga sob o peso de uma gota de orvalho?
É verdade que se amamos a vida, é por estarmos mais habituados a amar do que a viver.
Há sempre o seu quê de loucura no amor. Mas há sempre o seu quê de razão na loucura.
E quanto a mim, que gosto da vida, parece-me que aqueles que melhor se entendem com a felicidade, são as borboletas e as bolas de sabão, e tudo o que entre os homens se lhes assemelhe.
Ver revolutear essas alminhas aladas e loucas, graciosas e movediças, é o que arranca a Zaratustra vontade de chorar e de cantar.
Eu só acreditaria num Deus que soubesse dançar.
E quando vi o meu Diabo, achei-o grave, meticuloso, profundo, solene; era o espírito de Gravidade. É ele que faz cair todas as coisas.
Não é a cólera, é o riso que mata. Adiante! matemos o espírito de Gravidade!
Eu aprendi a andar: desde então deixei de esperar que me empurrassem para mudar de sítio.
Vede como me sinto leve; vede, estou a voar; vede, agora vejo-me do alto, como um pássaro; vede, um Deus dança em mim.

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Deviamos considerar perdido cada dia em que não dançamos pelo menos uma vez.

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Friedrich Nietzsche

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Afterimage

Disparou. Tocou. de raspão. quem. Alguém. «foi*».

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